segunda-feira, 8 de maio de 2017

A QUESTÃO DO DIVÓRCIO

UMA QUESTÃO IMPORTANTE

O anacronismo semântico do pastor Paulo Junior
Sua pregação sobre o divórcio é mais uma SELEÇÃO do que uma EXPOSIÇÃO, por isso gera mais CONFUSÃO do que COMPREENSÃO.


O divórcio tem sido um dos assuntos polêmicos e difíceis. Lamentavelmente muitos pastores ou ignoram o assunto ou exibem posições extremas e muitas das vezes não bíblicas. Como todo assunto tocado pelas Escrituras o divórcio precisa ser entendido por meio de um estudo detido e paciente das passagens.
Como pregadores e ensinadores e pastores precisamos ter uma posição bíblica sobre o casamento, o divórcio e o novo casamento. Precisamos nos enforçar para entender as passagens que tratam sobre o assunto à luz dos contextos e da teologia bíblica. Não devemos negligenciar um assunto tão importante para a prática pastoral.
Porém, lamento que alguns pastores e pregadores tenham tomado posições absurdas, extremas e na maioria das vezes ambíguas. Muitas pregações sobre o assunto tem trago mais confusão do que compreensão ao povo de Deus. E como cristão e pregador e pastor me preocupo com este assunto e preciso me debruçar nas Escrituras para compreendê-lo.
Como exemplo de pregações que tem trago mais confusão do que compreensão é a do pastor Paulo Junior, muito conhecido e apreciado por muitos. O nobre pastor tem sido instrumento divino para nossa época e tem trago edificação para o corpo de Cristo aqui no Brasil. No entanto, no seu vídeo sobre o divorcio, o nobre pastor faz uma pregação que mais traz confusão do que compreensão. Para muitos que compreendem e tem estudado as posições relacionadas sobre o divórcio e o novo casamento (que são quatro) podem captar a posição dele, mas muitos leigos têm estado confusos pelas posições elencadas pelo nobre companheiro. Entendo que o pastor Paulo Junior não fez uma exposição sobre o assunto, mas usando pontas soltas advogou sua posição que mais trouxe confusão do que compreensão. Sua afirmativa é que o casamento só pode ser desfeito pela morte de um dos cônjuges, negligenciando assim textos que falam claramente que o divórcio é possível e permitido (não exigido!) pela prostituição-adultério no caso de um casal crente (Mt 19.9), e também pelo abandono no caso de um casal em que um dos cônjuges é descrente e não quer permanecer com o irmão ou a irmã (1Co 7.12-16). Isso sem levar em conta que o “princípio do abandono” pode ser aplicado ao casal crente em que um dos cônjuges cometa barbáries (espancamento e etc – isso seria outro artigo).
A tônica da posição do pastor Paulo Junior é que a palavra grega “porneia” (relações sexuais ilícitas – ARA) usada em Mateus 19.9 não se aplica a pessoas casadas, mas a pessoas que são noivas (referindo-se a primeira fase do casamento em Israel que só poderia ser dissolvido pelo divórcio). Caso um dos nubentes cometa infidelidade pode-se divorciar e casar novamente. Mas, para ele “porneia” não se aplica às pessoas casadas, concluindo que não há base para o divórcio caso um dos cônjuges seja infiel por meio de qualquer tipo de imoralidade sexual (significado abrangente da palavra grega “porneia”). O lado não adúltero precisa manter-se casado aconteça o que acontecer, visto que o novo casamento, na posição de Paulo Junior, só é aceito após a morte de um dos cônjuges. Então, o irmão ou a irmão ficam sujeitos à servidão (claro que aqui já estou colocando a situação em que o cônjuge adúltero não se arrependa e continue na infidelidade – o pastor precisa lutar perseverantemente pela restauração do casamento, porém entendemos que o divórcio é possível e permitido (mas, não exigido ou incentivado) com base na “imoralidade sexual” = adultério).
Porém, a posição elencada pelo nobre pastor é baseada num falso entendimento da palavra grega “porneia”. Paulo Junior cai num erro exegético que os teólogos chamam de anacronismo semântico, que, em palavras simples, significa você transportar para o texto bíblico ou para uma palavra usada no texto bíblico um significado que não tinha na época – significado que não estava na mente do escritor bíblico e nem na dos seus ouvintes/leitores. Isso aconteceu muito com a palavra “poder” em Atos 1.8, que no grego é “dynamis”. Muitos desavisadamente transportam para o texto bíblico o significado moderno de “dinamite” afirmando que recebemos a dinamite do Espírito Santo para explodir o inferno. Enquanto o texto está se referindo a capacitação do Espírito Santo para sermos testemunhas de Jesus Cristo.
Vamos esclarecer um pouco mais!

A CLÁUSULA DE EXCEÇÃO: “EXCETO POR PORNEIA
De acordo com a exceção, mencionada em Mateus 5.32 (παρεκτὸς λόγου πορνείας = paraktos logou porneias) e Mateus 19.9 (μὴ ἐπὶ πορνείᾳ = mê epi porneia), o divórcio é ilegítimo, exceto no caso de “infidelidade” (NVI); “exceto por imoralidade sexual” (ARA); “exceto em caso de relações sexuais ilícitas” (ARC). Em outras palavras, a Bíblia reconhece a legitimidade do divórcio por causa da infidelidade conjugal.
Entendamos uma coisa antes de prosseguir. A reação dos discípulos em Mateus 19.10 prova que o Senhor Jesus defendia uma postura do ideal divino para o casamento: “o divórcio é proibido uma vez que o casamento foi consumado”, AINDA QUE abrisse exceção para o divórcio no caso de imoralidade sexual-adultério. Ademais, embora o judaísmo contemporâneo EXIGISSE o divórcio no caso de imoralidade sexual (cf. m. Sotá 5:1), o Senhor Jesus apenas o PERMITIU (e, portanto, deixou implícita a NECESSIDADE DE PERDÃO)[1].
A postura evangélica mais ampla é que o divórcio e o novo casamento são PERMITIDOS (não EXIGIDOS - sempre buscamos, como pastores, o perdão, a reconciliação e a restauração) no caso de imoralidade sexual. Ou seja, não é permitido se divorciar por qualquer motivo, mas, é PERMITIDO, e não EXIGIDO, divorciar APENAS, no contexto de Mateus, por causa da imoralidade sexual. Isso não foi levado em conta na pregação de Paulo Junior que apenas afirmou que isso se referia ao noivado. Todavia, tal afirmação é baseada numa má compreensão da palavra “porneia” como nós veremos a seguir.

Porneia se refere à dissolução do compromisso do noivado?
Alguns advogam (Paulo Junior) que a palavra “porneia” se refere à dissolução do compromisso de noivado, não, porém do casamento. Pontuando, que não é permitido se divorciar mesmo que um dos cônjuges cometa adultério.
Aqui é necessário compreender o sentido dos termos “porneia” e “moichao” (adultério).
Usando a tradução “fornicação” para “porneia” alguns advogam que Jesus se referia ao rompimento do compromisso de noivado, não ao casamento em si. Tal compreensão é baseada no significado dado a palavra fornicação: “pecado sexual por pessoas não casadas”. Já adultério significa “pecado sexual que envolve pessoa casada”. Então, baseado neste significado “moderno” muitos chegam à conclusão (aqui está o anacronismo semântico) que o divórcio foi permitido por Jesus somente no caso de fornicação (durante o compromisso de noivado) e NUNCA no caso de adultério. Esse é o ponto advogado por Paulo Junior e alguns.
Contudo, ESSA DISTINÇÃO NÃO DEVE SER INSERIDA NA BÍBLIA (isso é o erro exegético chamado anacronismo semântico). Fazer isso, como Paulo Junior o fez, é ser descuidado na exegese. É negligenciar porções das Escrituras. Os reformadores já diziam que é a Bíblia que interpreta a Bíblia. Mas, Paulo Junior, aqui, não seguiu o conselho dos reformadores, mas seguiu os dicionários modernos. Então, em vez de interpretar a Bíblia pela Bíblia, ele, e alguns, interpretaram a Bíblia pelo dicionário!
Os escritores da Bíblia empregaram a palavra “porneia” (fornicação) para descrever o pecado SEXUAL EM GERAL (não apenas entre pessoas solteiras – como afirmado por Paulo Junior), e, na Bíblia, refere-se a casos de incesto (1Co 5.1), homossexualismo (Jd 7) e até adultério (Jr 3.1,2,6,8 – aqui uma adúltera sofre o divórcio por causa da sua fornicação (porneia; cf. os versículos  2 e 6 na LXX; Cf. Os 2.2-5)[2]. “Porneia” era de fato uma palavra genérica aplicada a infidelidade sexual ou “infidelidade conjugal” (Arndt-Gingrich)[3].
Nas duas passagens (Jr 3 e Os 2), “porneia” e o verbo relacionado “poerneuõ” se referem ao rompimento da aliança de casamento de Israel com Yahweh por causa da “imoralidade” espiritual, à qual os termos justapostos “porneia” e “moicheia” (ou verbos correspondentes) se referem reciprocamente. Além de não haver NENHUMA DISTIÇÃO NÍTIDA entre as duas expressões, há, de fato, continuidade. Em nenhum desses contextos o escopo de referência de “porneia” é limitado apenas ao rompimento de um noivado conforme ensinado pelo pastor Paulo Junior. Fica evidente nos textos acima que se refere a UMA ALIANÇA DE CASAMENTO EXCLUSIVA E VITALÍCIA. Ademais, em Mateus 19.9, além de “porneia” e “moicheuõ”, também é usado o termo “gameõ” (que significa “casar-se”, ou, no presente contexto, “casar-se novamente”). Por esses motivos, parece difícil NEGAR que o tema em discussão nessas passagens seja CASAMENTO E VIOLAÇÃO DA ALIANÇA DE CASAMENTO, e não apenas rompimento de um NOIVADO[4].

Por isso, posso afirmar com todo respeito que o nobre pastor Paulo Junior não fez uma EXPOSIÇÃO, mas uma SELEÇÃO dos textos para apoiar sua proposição principal – novo casamento só com a morte do cônjuge. Diferente dos vídeos dos pastores Augustus Nicodemus, Hernandes Dias e John MacArthur sobre o assunto, Paulo Junior escorrega grosseiramente em sua exegese. Trazendo mais confusão (como aconteceu aqui em Campina Grande-PB num aconselhamento que fiz com dois casais após ouvirem sua pregação) do que esclarecimento. Aconselho que os leitores escutem as palestras dos pastores citados. Suas exposições trazem esclarecimento e não confusão. A exposição bíblica deve trazer ESCLARECIMENTO e não AMBIGUIDADES e CONFUSÕES. Aconselharia Paulo Junior excluir o vídeo da pregação feita por ele e estudar mais o assunto e expor seu argumento revelando outros pontos aceitos pela maioria dos evangélicos do mundo (pra citar alguns: Jay Adams, John MacArthur, R. C. Sproul, John Stott, Andreas Kostenberger, David Jones, Craig Blomberg, D. A. Carson, John Murray, Robert Stein, William Heth; também se encontra expressão na Confissão de Fé de Westminster). Agora, entendam, neste ponto, sobre divórcio e novo casamento, o nobre pastor Paulo Junior foi infeliz em suas colocações negligenciando assim uma boa e apurada exegese. Sua pregação, sobre este assunto, por si só se destrói. Pastoralmente falando não é válida, pois negligenciou muitos pontos importantes das Escrituras. Todavia, não invalida o que ele tem feito em outras exposições. Por favor, sejamos maduros e compreensíveis aqui, pois, lamentavelmente, tem gente que defende pessoas com suas asneiras sem conhecimento de nada.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS!
1. É correto dizer que, nas Escrituras, Deus reconhece a existência do divórcio e o regulamenta cuidadosamente. Então, o que nos cabe fazer como líderes e oficiais da igreja de Cristo é procurar regulamentá-lo para o povo de Deus, de acordo com os princípios expostos da Bíblia.

2. O Senhor Jesus reconheceu e declarou especificamente que o divórcio é algo que constituiu uma mudança do ideal divino: “desde o princípio não foi assim” (Mt 19.9). No mesmo versículo Ele declarou que foi por causa da dureza de coração dos judeus que Moisés “permitiu” (“epitrepo”) o divórcio. Então, conceder ou permitir uma prática não é o mesmo que originá-la, estabelecê-la ou instituí-la.

3. Diversamente do casamento, o divórcio é uma instituição humana. As evidências disponíveis, (bíblicas) mostram que, embora o divórcio seja reconhecido, permitido e regulamentado na Bíblia, diferentemente do casamento não foi instituído por Deus. Faz parte da Queda, por isso Deus o regulamentou (Dt 24) e o Senhor Jesus e Paulo pontou detalhes instrutivos.

4. Contrariamente a algumas opiniões, o conceito de divórcio é bíblico. A Bíblia reconhece e regulamenta o divórcio. Foram feitas certas provisões para essa prática. Essa verdade deve ser afirmada claramente e sem hesitação. Visto que o divórcio é um conceito bíblico, ao qual se faz frequente referência nas páginas da Bíblia, os cristãos deverão fazer tudo o que puderem para entender e ensinar o que Deus, em Sua Palavra, diz a respeito do assunto. Além disso, requer-se que a igreja aplique a casos individuais os princípios escriturístico relacionados com o divórcio.

5. A igreja precisa ser uma comunidade terapêutica trazendo às pessoas para o bálsamo das Escrituras, sejam elas casadas, solteiras, celibatas, viúvas ou divorciadas. É duro constatar a inabilidade bíblica e pastoral de muitos líderes com relação às pessoas divorciadas como se tivessem cometido um pecado imperdoável. Lembre-se que o ÚNICO PECADO IMPERDOÁVEL É A BLASFÊMIA CONTRA O ESPÍRITO SANTO!

6. O pecado de divorciar-se do seu cônjuge sobre bases NÃO BÍBLICAS é ruim, não somente devido à miséria que ocasiona, mas por que é uma ofensa contra um santo Deus. Contudo, não é tão indelevelmente impresso na vida do pecador que não possa ser expiado pelo sangue de Cristo. Aqui, tenho que afirmar que Paulo Junior que anuncia tanto o evangelho esquece-se de anunciá-lo aos divorciados! Todas as vezes que o Senhor Jesus e Paulo falam sobre o divórcio eles anunciam o evangelho ao falar de perdão, reconciliação e restauração! Paulo Junior anuncia a lei, mostrando o santo padrão de Deus, mas esquece-se, depois que o pecador se desespera diante da santidade de nosso Deus, de anunciar o perdão e a reconciliação pelos méritos sacrossantos de Jesus Cristo! A igreja não deve perder isso de vista, senão o legalismo toma de conta!

7. Uma vez que o pecado do divórcio não é um pecado imperdoável, claro está que pode ser perdoado. O divórcio, mesmo quando próprio, sempre é ocasionado pelo pecado de alguém. Ou seja, todo divórcio é ocasionado pelo pecado, mas nem todo divórcio é pecaminoso. Todavia, mesmo no melhor dos casos, o divórcio sempre trás infelicidade e dor. Por isso Deus o odeia. Mas, mesmo aquele que obteve o divórcio por meios pecaminosos pode ser perdoado, purificado e restaurado à comunhão da igreja de Cristo, precisamente como os beberrões e os homossexuais mencionados em 1Coríntios 6.9-11, desde que ARREPENDIDOS.

8. É importante desenvolver uma atitude bíblica, equilibrada (e não confusa, no caso de Paulo Junior e outros), para com o divórcio – por um lado, odiando todas as coisas que Deus odeia quanto ao divórcio, embora reconhecendo, por outro lado, que neste mundo pecaminoso há situações nas quais (como o próprio Deus demonstrou, pode ser necessário obter o divórcio).

O texto já ficou longo demais para a maioria, mas para mim e outros que gostam de se aprofundar está curto demais! Porém, acredito que alcancei o pretendido. Alertando aos leitores que poderia ampliar o assunto. Ainda, esclareço que não fiz um artigo sobre casamento e novo casamento, mas especificamente sobre um ponto relacionado ao divórcio citado pelo nobre pastor Paulo Junior.

IVAN TEIXEIRA
Minister Verbi Divini
Soli Deo Gloria!




[1] KÖSTENBERGE, Andreas J. Deus, Casamento e Família: Reconstruindo o Fundamento Bíblico, p.236. São Paulo, SP, Brasil: Vida Nova, 2011.
[2] ADAMS, Jay E. Casamento, Divórcio e Novo Casamento na Bíblia, p.99. São Paulo, SP, Brasil: PES, 2012.
[3] STOTT, John. Grandes Questões Sobre o Sexo, p.83. Niterói, RJ, Brasil: VINDE, 1993.
[4] KÖSTENBERGE, 2011, p. 238.

2 comentários:

  1. O casamento aos olhos de Deus é tão valorizado que Deus faz paralelos à Cristo e a Igreja!

    Depois Deus odeia o divórcio;
    Depois Deus dos 2 faz um;
    Depois Deus até que a morte os Separe;
    Depois Deus um só estará livre com a morte do ortro;
    Depois Jesus No princípio não foi assim;
    Depois os discípulos também entenderam que sendo assim o melhor é não casar;
    Depois Jesus nem todos são aptos para tal;
    Depois Paulo em 1 Coríntios 7:1...reforça esse ponto;
    Depois 1 Coríntios 7:10...claro como a Luz que Brilha, reprova separação e nova União;
    Aí nós por causa de Mt 19:9, vemos a brexa que os Fariseus tanto se agradam a ponto de o experimentar Jesus;
    Erramos por não conhecer as escrituras e a vontade de Deus e ou perverter o evangelho!
    Mt 24 Jesus deixa Claro que tudo isso aconteceria!
    Suas Profecias tem se cumprido dia após dia!
    Que o Santo Espirito de Deus possa nós lembrar dos ensinamentos do Pai e do Filho!
    Aleluia!

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  2. Paz do Senhor! Grato pelo esclarecimento, divorciado por infidelidade, posso casar de novo, graças a Deus.
    Pb Rodrigo de Caxias do Sul RS

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