segunda-feira, 8 de maio de 2017

CRISTÃOS E TATUAGENS

TATUAGEM

Uma crítica bíblico-teológica às afirmações do Bispo Rodovalho


Hoje pela manhã (06/09/14) estive ministrando para os jovens de nossa congregação e um deles me falou sobre um vídeo do bispo Rodovalho sobre a tatuagem. Assisti boquiaberto tal vídeo do bispo Rodovalho afirmando e incentivando o uso da tatuagem. É lamentável que um líder conhecido em Brasília faça tais afirmações. O que me surpreende é a ginástica interpretativa de alguns textos bíblicos para apoiar o uso da tatuagem pelos cristãos.
Ele diz que Jesus, no livro do Apocalipse, usava tatuagem. A referência que ele cita é Apocalipse 19.16: “Tem no Seu manto, e na Sua coxa, um nome inscrito: REI DOS REIS E SENHOR DOS SENHORES”.
O bispo Rodovalho usa este versículo para apoiar a ideia de que podemos fazer tatuagens. Se Jesus tinha tatuagens, nós também podemos ter, conclui o bispo. Mas, será que o texto realmente diz e aprova o uso da tatuagem em nosso corpo?
O comentarista Simon Kistemaker faz a seguinte observação:
São muitas as interpretações da localização precisa das palavras manto e coxa. Essas interpretações variam na identificação de manto e coxa - porque aquele [manto] cobre esta [coxa] - como tendo o nome escrito numa espada no lugar de coxa. Se interpretarmos a frase no sentido de “em seu manto, isto é, em sua coxa”, ou enfileirarmos evidências de estátuas antigas com nomes escritos nas coxas, permanece o fato de que o quadro é meramente simbólico. A coxa é uma figura de poder e, o manto, um símbolo de majestade real. A inscrição majestática se aplica a ambas as regiões[1].

Claramente o texto nos diz que nosso Senhor glorificado usará na Sua vinda em glória uma faixa sobre o Seu manto que se estenderá até a coxa, com a inscrição de um título que enfatiza a Sua absoluta soberania sobre todos os governantes humanos[2]. Notem que Simon Kistemaker afirma que mesmo se a inscrição estivesse na coxa “permanece o fato de que o quadro é meramente simbólico”. O bispo Rodovalho erra e feio em seu entendimento do texto!

Exegese textual: O texto grego reza: ἐπὶ τὸ ἱμάτιον καὶ ἐπὶ τὸν μηρὸν αὐτοῦ (epi to himation kai epi ton mêron autou, “no manto, sobre a coxa dele”), o que poderia se referir a duas partes do corpo, mas a maioria dos estudiosos concorda (e.g., Beckwith, Ladd, Mounce, Beale, MacArthur, Barclay) que é “sobre o Seu manto, isto [kaí – conjunção apositivo], sobre Sua coxa”. Em outras palavras, o nome está escrito naquela parte do manto que cobre Sua coxa, o lugar em que a espada é guardada e que ficaria em evidência em um guerreiro montado num cavalo[3].

Devemos usar chifres também?
Agora, imagine se o Bispo Rodovalho lesse: “[...] um Cordeiro como tendo sido morto. Ele tinha sete chifres [...]” (Ap 5.6). Acho que ele apregoaria: “Vamos usar chifres também, porque Jesus tinha sete chifres”. É lamentável como este cidadão interpreta as Escrituras de forma mirabolante para agradar uma geração que quer fazer de tudo que está na moda, menos se submeter aos claros ensinos das Escrituras Sagradas.
Aqui (Ap 5.6) e em Apocalipse 19.16, temos uma figura de linguagem que aponta para uma realidade. Na Escritura, chifres sempre simbolizam poder porque, no reino animal, os chifres são usados para exercer força e causar ferimentos no combate. Sete chifres significam poder total e perfeito. Então, tanto em Apocalipse 5.6, como em Apocalipse 19.16 temos expressão figurativas e proverbiais de realidade características de Jesus como Todo Poderoso Salvador, Soberano e Majestoso Rei.
Veja que Paulo afirma, sem mencionar a coxa, que Jesus (Deus) é “[...] bendito e único Soberano, o Rei do reis e Senhor dos senhores” (1Tm 6.15; cf. Ap 17.14). É lamentável quando um líder quer distorcer a Bíblia para seus próprios interesses, bem como agradar uma geração que quer tatuar Jesus no peito, mas não querem tê-Lo como Salvador e Senhor de suas vidas.

Gravados nas palmas das Mãos de Deus
Mesmo que o bispo não use o texto de Isaías, citou-o (bem como outros) para uma análise.
Isaías 49.16: “Eis que nas palmas das minhas mãos te gravei; os teus muros estão continuamente perante Mim”.
Temos neste versículo um incentivo ou um sinal verde para fazermos tatuagens em nosso corpo? Vejamos o que o texto diz.
Aqui temos uma expressão figurativa, não literal, como um sinal da devoção de Yahweh para o Seu povo. Deus não esqueceria de Seu povo. Essa é a verdade por detrás da expressão proverbial: “Eis que nas palmas das minhas mãos te gravei”. Não temos aqui uma permissão e um imperativo para fazer tatuagens, mas, sim, uma figura de linguagem que revela que Deus nunca esquece e abandona Seu povo. Note que o povo estava reclamando: “Mas Sião diz: O SENHOR me desamparou, o SENHOR se esqueceu de mim” (Is 49.14). Qual a resposta divina?
Acaso pode uma mulher esquecer-se do filho que ainda mama, de sorte que não se compadeça do filho do seu ventre? Mas ainda que esta viesse a se esquecer dele, Eu, todavia, não Me esquecerei de ti (Is 49.16).

E depois Deus que usa a metáfora de uma mãe, Ele fala figuradamente sobre eles estarem gravados nas palmas de Suas mãos (Is 49.16: “Eis que nas palmas das minhas mãos te gravei; os teus muros estão continuamente perante Mim”).

Não podemos traduzir, compreender e transformar uma expressão figurativa e proverbial numa realidade física. Esse foi o erro dos fariseus. Eles traduziram a ordenação de Yahweh em Êxodo 13.9: “E será como sinal na tua mão e por memorial entre teus olhos; para que a lei do SENHOR esteja na tua boca; pois com mão forte o SENHOR te tirou do Egito”, na realidade física dos filactérios – as caixas de oração de couro que eram colocadas no braço esquerdo e na testa com a inscrição de certas palavras (Ex 13.1-16; Dt 6.4-9; Dt 11.13-21).
Tal como os fariseus, o bispo Rodovalho traduz e compreende uma expressão figurativa e proverbial (como Ap 19.16) de forma literal. Como se tivéssemos um apoio escriturístico para fazermos tatuagens. Nosso Senhor condenou tal prática dos fariseus, visto que não compreendiam as expressões proverbiais para obedecerem de todo o coração os mandamentos do SENHOR. Deus não queria que eles fizessem caixinhas, mas que obedecessem os Seus mandamentos. Não temos uma ordem para fazer tatuagens só porque temos um texto que relata uma visão de João em que ele ver uma inscrição no manto que está sobre a coxa de nosso Senhor Glorificado. Temos, sim, uma ordem para nos submeter a Ele como Salvador e Senhor de nossa vida.
Em vez de vocês quererem fazer tatuagens de uma cruz, façam o que o Senhor Jesus disse: Tome cada dia sua cruz e Me sigam (cf. Mt 16.24). Ou seja, vivam uma vida de renúncia. Isso engloba também a renúncia de fazer tatuagens, visto que está na moda. Jesus não ordena a fazermos uma cruz e sair levando-a nas costas pela rua. E nem nos ordena a tatuar uma cruz. Ele nos ordena, como o texto deixa claro, a renunciar a nós mesmos e identificarmo-nos com Ele.

Outro exemplo de linguagem figurativa e proverbial apontando a realidade da lembrança é Cântico dos cânticos 8.6: “Põe-me como selo sobre o teu coração, como selo sobre o teu braço, porque o amor é forte como a morte, e duro como a sepultura o ciúme; as suas brasas são brasas de fogo, são veementes labaredas”.

Claramente a Bíblia proíbe a tatuagem ou qualquer marca em nosso corpo
Há indícios claros do costume de se fazerem tatuagens pelos pagãos, pelo qual são marcados com ponta de agulha ou queimados na pele e vivificados com o uso de tintas, marcas e figuras diversas. Em Israel, todavia, este costume era proibido. Em Levítico 19.28, lemos: “Pelos mortos não ferireis a vossa carne; nem fareis marca nenhuma sobre vós: Eu Sou o SENHOR”.
R. N. Champlin nos esclarece: “Isso parece ser uma clara proibição do uso de tatuagens, entre os judeus. Uma das mais horrendas tatuagens eram aqueles números que os nazistas tatuavam no braço dos judeus que estavam condenado a morrer nos campos de concentração, onde foram mortos seis milhões de israelitas, a mando de Hitler e sua infame camarilha”[4].
Charles Ryrie escreve que “tanto a mutilação quanto a tatuagem eram práticas comuns entre nações pagãs”[5].
John MacArthur traz o seguinte e esclarecedor comentário:
Essas práticas pagãs muito provavelmente estavam associadas à idolatria egípcia e, por isso, deviam ser evitadas. A prática de fazer profundas marcas na face e nos braços ou pernas em tempos de luto era comum entre os pagãos. Era visto como uma marca de respeito pelos mortos, bem como uma espécie de sacrifício propiciatório oferecido aos deuses que presidiam sobre a morte. Os judeus aprenderam esse costume do Egito e, embora tivessem disso afastados do mesmo, recaíram na antiga superstição (cf. Is 22.12; Jr 16.6; 47.5). A tatuagem também estava ligada a nomes de ídolos e eram sinais permanentes de apostasia[6].

Se o bispo Rodovalho aprova e incentiva a tatuagem, também, necessariamente deve aprovar a mutilação. É lamentável que um líder evangélico apoie e incentive tais práticas, claramente pagãs, e, ainda diz que é para a glória de Deus.

Ouça a Palavra e não os homens!
Vale lembrar o que Deus diz em Sua Palavra, não o que líderes populares afirmam:
Jeremias 10.2: “Assim diz o SENHOR: Não aprendais o caminho dos gentios, nem vos espanteis com os sinais dos céus, porque com eles os gentios se atemorizam”.
Romanos 12.2: “E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”.
Estar “conformado” com este mundo é estar com (prefixo latino con) as formas ou estruturas deste mundo. Isso significa fazer coisas populares. O conflito é este: o que é popular [como a tatuagem] para os homens nem sempre é popular para com Deus. Agradar a Deus nem sempre é agradar ao homem. Às vezes devemos escolher a quem iremos agradar. Na vida cristã, essa é uma luta diária[7].

Se você quer ter alguma marca no corpo: Sofra por Cristo!
Paulo escreveu em Gálatas 6.17: “Quanto ao mais, ninguém me moleste; porque eu trago no corpo as marcas de Jesus”.
Só falta o referido bispo citar esta passagem e dizer: “Podem se tatuar, pois Paulo, o grande apóstolo tinha tatuagens de Jesus”.
Estas “marcas” mencionadas por Paulo eram os resultados físicos da perseguição (cicatrizes, feridas, etc.) que identificavam Paulo como uma pessoa que havia sofrido pelo Senhor (cf. At 14.19; 16.22; 2Co 1.5; 4.10; 11.25; Cl 1.24).
O senhor Rodovalho poderia ensinar a juventude a ter estas marcas de sofrimento em favor do santo evangelho. Ele deveria incentivar a juventude a ter marcas – não tatuagens com versículos e etc., - de sofrimento por causa de nossa identificação com Cristo.
As marcas de Jesus que Paulo tinha em seu corpo não erar artes de um profissional de tatuagens, mas ele estava marcado pelos sofrimentos, sofridos pela causa de Cristo, que tinham deixados sinais indeléveis em seu corpo quebrantado pelas asperezas da caminhada de um apóstolo de Cristo.
Ivan Teixeira
Minister Verbi Divini
Soli Deo Gloria!




[1] KISTEMAKER, Simon. Exposição do Livro do Apocalipse, pág.660 (São Paulo, SP, Brasil: Editora Cultura Cristão, 2004) – (Coleção Comentário do Novo Testamento).
[2] MACARTHUR, John F. A Bíblia de Estudo MacArthur, pág.1806 (Barueri, SP, Brasil: Sociedade Bíblica do Brasil, 2010).
[3] OSBORNE, Grant R. Apocalipse: Comentário Exegético, pág.767 (São Paulo, SP, Brasil: Vida Nova, 2014).
[4] CHAMPLIN, R. N. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia, Volume 6, S – Z, pág.325 (São Paulo, SP, Brasil: Editora Hagnos, 5.ed., 2001).
[5] RYRIE, Charles. A Bíblia Anotada, pág. 165 (São Paulo, SP, Brasil: Editora Mundo Cristão, 1991).
[6] Op. cit., pág.170 (2014).
[7] SPROUL, R. C. Como Viver e Agradar a Deus, pág.45 (São Paulo, SP, Brasil: Editora Cultura Cristã, 2.ed., 2006).

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