Marta e Maria: UMA PERCEPÇÃO INTERPRETATIVA (Lc 10.38ss)
É notório como a
percepção e entendimento das pessoas têm mudado com relação ao texto de Lucas 10.38-41, que fala de Marta e
Maria. Parece-me que aquilo que foi motivo de repreensão da parte do Senhor
Jesus, as pessoas de nossa época estão aprovando e louvando. Aquilo que Ele
elogiou, as pessoas estão menosprezando. Será que isso não seja uma inversão
dos valores contextuais?
Observo que as
pessoas estão enaltecendo a atitude de Marta, afirmando que nosso Senhor Jesus
precisa tanto de Marias aos Seus pés como também de Martas com seus serviços
prestados a Jesus. É claro que não devemos depreciar os valores serviçais de
Marta, mas pergunto: Qual o entendimento do texto que pretende sobressair para os
ouvintes e leitores de Lucas e para nós? Qual é o ensino do contexto e não o
nosso ensino preferencial?
Em certo
sentido posso afirmar que a percepção interpretativa atual e popular do texto é
um entendimento errado do evangelho ou mesmo uma distorção do evangelho pelo
espírito da nossa época. Não é Jesus que precisa de nossos serviços, somos nós
que precisamos sentar-se para ouvir a Palavra de Jesus Cristo.
Compreendemos
que tal interpretação é oriunda de uma sociedade que impera o ativismo, o
pragmatismo, o materialismo, o individualismo, o consumismo e que é marcada
pela ansiedade e, por conseguinte pela depressão. As pessoas estão correndo de
um lado para outro com o pretexto de estarem fazendo as coisas para Jesus, mas
não têm tempo para se sentarem para ouvir a Palavra de Jesus.
Atualmente
louvam-se aqueles que fazem serviços para Jesus. Aplaudem-se os agitados, os
preocupados e aqueles que são inquietos com muitas coisas. Num certo sentido
aplaude-se e admira as Martas em vez daquela que foi apreciada e louvada pelo
Senhor Jesus.
A sociedade,
porventura, não valoriza tais Martas? Será que o espírito de Marta não é
admirado e até imitado pelo mundo? Enquanto as Marias, as mulheres de oração,
de estudo e que se dedicam a buscar a Deus diuturnamente, não são depreciadas e
chamadas de beatas de igrejas?
Notem que as
pessoas que são agitadas e envolvidas com muitos serviços são as
verdadeiramente importantes para a sociedade e cultura consumista. Entende-se
que aquelas pessoas que têm dois trabalhos ou empregos, muitas especialidades,
muitos cartões de créditos e etc., são as que verdadeiramente importam. Pessoas
com estas qualidades num mercado competitivo serão as vencedoras.
Na Suíça as
pessoas primeiramente perguntam o que você faz? Qual seu trabalho? Não importa
quem você é ou o que você pensa de Deus e da moralidade, o que importa é o que
você faz e qual o seu emprego. Claramente as Marias não servem, mas as Martas
são bem-vindas!
No entanto, as
pessoas se esquecem de que a mensagem do texto enfatiza não o que fazemos para
Cristo, mas aquilo que Jesus fez por nós. Não aquilo que podemos fazer ou
oferecer para Jesus, mas aquilo que Jesus pode nos dá e nos ensinar. João no seu Evangelho pretende levar
seus ouvintes e leitores para crerem que Jesus é o Filho de Deus e crendo terem
vida eterna em Seu Nome (20.31).
Numa ocasião
lemos que Pedro estava disposto a
morrer por Jesus, mas não admitia que Jesus morresse por Ele (Mt 16.22; Lc
22.33). Que heroísmo este de Pedro! Estava disposto a ser preso e até a morrer
por Jesus, mas não entendia que o mais importante, e isso não será tirado
daqueles que entendem, é Cristo Jesus morrer em nosso lugar. Tal como Marta e Pedro nós estamos dispostos a fazer muitas coisas para Jesus, mas
dificilmente queremos sentar aos pés de Jesus.
Somos produtos
de uma sociedade inquieta, agitada, ocupada, preocupada e ansiosa com muitas
coisas para ter tempo de sentar-se aos pés de Jesus para ouvir Seus
ensinamentos. Não é a toa que muitos frequentadores das igrejas locais gostem
dos cultos rápidos, sermões rápidos e curtos. Mas se tivermos um show, uma
discoteca, uma balada ou um comício gospels, certamente teremos todo o tempo
possível para nos divertir. Suportamos a noite toda. Como disse Paulo, haverá um tempo em que não
suportarão a sã doutrina.
Com isso não
quero dizer que as atividades e os serviços congregacionais e administrativos
não sejam importantes, mas o mais importante é estar aos pés de Jesus. A
agitação, preocupação e a ansiedade de Marta foram peremptoriamente
repreendidas por Jesus, mas a quietude meditativa, a paciência de está aos pés
do Mestre, a atenção devida ao Senhor Jesus e o ouvir Suas Palavras são a coisa
mais importante e essencial para um cristão. Essas coisas foram e são
apreciadas pelo Senhor Jesus, mesmo que não seja popular em nossas igrejas
locais e sociedade.
I. Adorando como Maria, mas controlados pelos sentimentos de agitação,
inquietude e trabalho como Marta.
Muitos de nós
enfrentamos este conflito. Queremos adorar e estar aos pés do Senhor Jesus como
Maria, todavia os sentimentos de ativismos, inquietude, preocupação e agitação
nos dominam como dominou Marta. Temos um desejo de Maria, mas agimos como
Marta. Queremos estar aos pés do Senhor Jesus, mas quando nos reunimos na
igreja ficamos pra lá e pra cá como Marta, ocupados com muitas coisas.
Como pastor,
tenho observado que o ativismo congregacional tem substituído a adoração congregacional.
Pessoas pensam que fazer a obra, servir a Deus é estar ocupado com muitas
coisas, atividades, programações exaustivas e etc., mas sabemos que isso não é
o mais importante. Precisamos nos quedar como Maria aos pés do Senhor para
admirá-Lo, adorá-Lo e aprender d’Ele.
Somos
facilmente distraídos pelas coisas menos importantes e essenciais na vida. Isso
é verdade também na vida cristã. Ficamos agitados e inquietos com muitas coisas
e não nos quedamos para ouvir o que é mais importante e essencial para nossas
vidas como servos e servas de Deus.
Frequentemente
aplicamos nossas forças e preocupações no desempenho (performance: realizar,
conquistar). Quando o correto, mais sábio e proveitoso é empenhar nossos
sentidos a ouvir e adorar o Senhor Jesus, como fez Maria.
Em vez da
preocupação e ansiedade pelo servir um banquete digno do Senhor, um prato seria
suficiente; e Maria preferiu o banquete espiritual aos pés de Cristo: a melhor parte
(At 6.2,4; Mc 10.45; Jo 4.32-34; Ap 3.20).
II. Com quem nos identificamos mais: com Maria ou com Marta?
Se formos
sinceros, claramente nos identificamos mais com Marta do que com Maria. Marta
representa exatamente quem realmente nós somos: preocupados, agitados,
envolvidos com muitas coisas, ansiosos e até mesmo irritantes com as pessoas.
Não é essa a descrição textual de Marta? Agitada, ocupada em muitos serviços, irritada
com sua irmã, sentindo-se sozinha, inquieta, preocupada com muitas coisas e
ansiosa.
Será que nos
sentimos raivosos quando vemos as pessoas sentadas quietas e atenciosas
aprendendo dos grandes ensinamentos de Jesus Cristo? Marta se sentiu assim ao
ver Maria sentada despretensiosamente aos pés do Mestre.
As pessoas
movidas pelo ativismo serviçal sempre se irritarão com aqueles que se assentam
para aprender as grandes verdades da Palavra de Deus. Estes não veem o tempo
passar, pois não há maior prazer do que está assentado para ouvir a Palavra de
Deus. Porém, aqueles como Marta sempre estão olhando para o relógio,
cronometrando o tempo, vendo o que se tem para fazer e envolvidos em muitas
coisas e ainda com o coração inquieto e ansioso com tanto serviço.
As Marias que
são raras em nossos dias sempre escolhem a boa parte sem negligenciar suas
responsabilidades. De forma alguma perderão a oportunidade de ouvir Jesus
ensinando a Palavra de Deus.
IVAN TEIXEIRA
Servo da Palavra!
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