sexta-feira, 23 de março de 2018

A Bíblia, a Igreja e a Política.


A Bíblia, a Igreja e a Política.



Estou convicto de que Deus pretende que a Bíblia ofereça orientação para todas as áreas da vida, inclusive no tocante ao modo como os governos deve atuar!
Meu propósito neste trabalho é apresentar uma cosmovisão e uma perspectiva bíblicas sobre questões de política, lei e governo. Não pretendo fazer uma exposição secular de posicionamentos políticos, mas apresentar o ensino bíblico sobre os temas.
Concordo com o teólogo Wayne Grudem quando escreve que “a perspectiva de Deus sobre a política é alegre ‘boa-nova’, assim como o restante da Bíblia é boa-nova para todas as áreas da vida! Creio que os ensinos bíblicos a respeito de questões políticas promoverão esperança e mudanças benéficas para as pessoas de todas as nações em que forem aplicados”[1].
Cremos que as boas novas da Bíblia para os oprimidos, para aqueles que anseiam por justiça, para aqueles que desejam paz, para jovens e velhos, fracos e poderosos, ricos e pobres são caminhos maravilhosos da liberdade e de um governo sensato que glorifica a Deus e abençoa a cada ser humano.
A Bíblia como Palavra de Deus tem poder para parar o declínio moral e social de qualquer país. No lugar de declínio, se nós abraçarmos os princípios bíblicos, veremos progresso constante rumo a sociedades melhores, mais agradáveis e produtivas e com menos criminalidade; sociedades mais livres, gentis e felizes, nas quais poderemos viver.
A História comprova que os países que experimentaram grandes visitações de Deus nos avivamentos se tornaram sociedades melhores, mais agradáveis e com governos sensatos e mais justos.
Os princípios e ensinamentos da Bíblia contêm sabedoria proveitosa para todas as nações e para todos os governos.
Mesmos aqueles que não acreditam que a Bíblia é a Palavra de Deus devem analisar e considerar os princípios e ensinamentos bíblicos para um governo e política sensatos.

Pontos de vistas incorretos sobre a igreja e a política:
Meu objetivo aqui ao falar sobre esta temática é esclarecer muitos irmãos e irmãs a respeito destas visões. Não sou exaustivo, mas apenas aponto os tópicos e as referências para situar cada membro das igrejas locais. Um estudo mais profundo, é claro, exigiria uma exposição mais extensa. No entanto, acredito que Deus abençoará meu esforço a tornar este importante tema, igreja e política, claro, acessível e simples para o membro da igreja local.
Afirmo ainda que meu tom não é de erudição, mas sim pastoral. Sempre prezo como pregador e pastor uma tonalidade mais acessível ao povo de Deus. Não gosto de ser aquele “teólogo da varanda”, que apenas ver as pessoas passar nas estradas da vida atinando distante para suas perguntas, dilemas e problemas, mas aquele “teólogo do caminho” que caminhando na estrada ao lado dos transeuntes ouve suas indagações e entende suas dificuldades e desafio, e então fala uma linguagem compreensível ao membro comum da igreja local.

1. O governo deve impor a religião: Um governo sensato não deve, em momento algum, tentar obrigar as pessoas a crer numa religião específica ou segui-la; antes, deve garantir a liberdade religiosa para os seguidores de todas as religiões dentro da nação.
Concordo com as palavras do grande Thomas Jefferson quando redigiu a Declaração de Virgínia para a Instituição da Liberdade Religiosa (1779): “[...] todos os homens terão liberdade de professar e, por argumentos, defender suas opiniões em questões religiosas, o que não diminuirá, nem aumentará, nem afetará de qualquer outro modo sua capacidade civil”.
A visão de impor a religião é contrária à Bíblia e equivocada. Essa visão é incompatível com os ensinamentos do Senhor Jesus e com a própria natureza da fé. Sabemos que a fé ela vem pelo ouvir a pregação, e a pregação da Palavra de Cristo (Rm 10.17). Uma religião imposta não produz conversões verdadeiras. Conversões verdadeiras é obra de Deus Espírito Santo por meio da pregação do santo evangelho que é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê (cf. Jo 16.7-11; Rm 1.16).

2. O governo deve excluir a religião: Esse ponto de vista entende que é importante excluir a religião totalmente da vida pública. Religião é coisa da vida privada. Se uma pessoa quer ser religiosa que o faça no quarto de sua casa. Os deveres religiosos devem ser praticados em casa de modo discreto.
A visão se excluir a religião do governo é equivocada porque transforma liberdade religiosa em ausência de religião.
Uma coisa é impor uma religião como oficial; outra coisa é a religião influenciar na vida pública e política.
Excluir a religião vai contra a liberdade religiosa e a liberdade de expressão protegidas pela Constituição Federal. “O Estado [deve] prestar proteção e garantia ao livre exercício de todas as religiões”, pois “o Brasil é um país laico”.
A Constituição Federal, no artigo 5º, VI, estipula ser inviolável a liberdade de consciência e de crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos e garantindo, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias.

Expressar uma opinião religiosa em público não é o mesmo que obrigar as pessoas a aceitar esse ponto de vista! Então, a visão de que o governo deve excluir a religião é equivocada e prejudicial para a sociedade livre. Pode-se acrescentar que a visão de excluir a religião do governo tem de partir do pressuposto de que não existe Deus ou de que, se Ele existe, não temos como conhecer Seus padrões morais. Visto que a Bíblia diz, que a autoridade governamental é “serva de Deus para o teu bem” (Rm 13.4). A Bíblia também afirma que os governantes são “enviados para punir os praticantes do mal e honrar os que fazem o bem” (1Pe 2.14), mas como podem fazer isso se não é permitido a porta-vozes de religião alguma lhes dar conselhos a respeito do “bem” e do “mal”?[2]
O perigo dessa visão é que torna o governo um deus e, por conseguinte uma religião.

3. Todos os governos são perversos e demoníacos: Os proponentes desta visão afirmam que o âmbito do poder governamental é o âmbito de Satanás e de suas forças. Afirma-se também que todo governo civil é “demoníaco”[3].
Para basear tal visão tomam-se as palavras de Satanás em Lucas 4.6: “Dar-Te-ei toda esta autoridade e a glória destes reinos, porque ela me foi entregue e a dou a quem eu quiser”.
Afirma-se que Satanás é em termos funcionais “o diretor executivo de todos os governos da terra”.
Rejeitamos peremptoriamente este ponto de vista, pois textos bíblicos retratam o governo civil como uma dádiva de Deus, sujeita ao domínio de Deus (e não de Satanás), usada por Deus para Seus propósitos. Eis alguns desses textos:
Daniel 4.17: Esta sentença é por decreto dos vigilantes, e esta ordem por mandado dos santos; a fim de que conheçam os viventes que o Altíssimo tem domínio sobre o reino dos homens; e o dá a quem quer, e até ao mais humilde dos homens constitui sobre eles.
Romanos 13.1-6: Todo homem esteja sujeito às autoridades superiores; porque não há autoridade que não proceda de Deus; e as autoridades que existem foram por Ele instituídas. De modo que aquele que se opõe à autoridade resiste à ordenação de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos condenação. Porque os magistrados não são para temor, quando se faz o bem, e sim quando se faz o mal. Queres tu não temer a autoridade? Faze o bem e terás louvor dela, visto que a autoridade é ministro de Deus para teu bem. Entretanto, se fizeres o mal, teme; porque não é sem motivo que ela traz a espada; pois é ministro de Deus, vingador, para castigar o que pratica o mal. É necessário que lhe estejais sujeitos, não somente por causa do temor da punição, mas também por dever de consciência. Por esse motivo, também pagais tributos, porque são ministros de Deus, atendendo, constantemente, a este serviço.
1ª Pedro 2.13-14: Sujeitai-vos a toda instituição humana por causa do Senhor, quer seja ao rei, como soberano, quer às autoridades, como enviadas por Ele, tanto para castigo dos malfeitores como para louvor dos que praticam o bem.

Destaca-se que tanto Paulo como Pedro considera que o governo civil sensato se opõe à ação de Satanás na execução da recompensa dos que praticam o bem e no castigo dos que praticam o mal. Satanás incentiva o mal e não o bem. Quando um governo castiga os que praticam o mal está se opondo a Satanás e glorificando e cumprindo o propósito de Deus.
Claro que Satanás pode influenciar alguns indivíduos no governo, mas não está no controle.
Não é bíblica a visão de que todos os governos são demoníacos.

4. A igreja deve se dedicar ao evangelismo, e não à política: Há certos grupos que afastam totalmente sua mente de um engajamento na sociedade e na política. Entende que a igreja, ou os membros dela, deve apenas se dedicar ao evangelismo. Nesta rota entende-se que a igreja é chamada somente para “pregar o evangelho”, e não para falar de política.
No entanto, a pregação do evangelho deve incluir também aquilo que a Bíblia diz a respeito do governo civil. Isso significa que os cristãos aprenderão na Bíblia sobre como influenciar governos de modo que Deus seja honrado, glorificado e a sociedade abençoada. Porventura, os cristãos não são sal e luz do mundo? (Mt 5.13-14). Isso não significa afastamento, mas engajamento.
Mateus 5.13: sal da terra. Como o sal é benéfico de várias maneiras (como conservante, tempero etc.), assim são os discípulos de Jesus que influenciam o mundo para o bem. Mateus 5.14: luz do mundo. Os discípulos de Jesus têm a vida do reino dentro deles como um testemunho vivo para aqueles no mundo que ainda não têm a luz[4].
Deve-se destacar que muitos evangélicos entendem que “devemos apenas pregar o evangelho, e que esse é o único modo pelo qual os cristãos têm esperança de transformar o coração das pessoas e transformar nossa sociedade”. Entendo que a suprema Missão da Igreja em relação ao mundo seja pregar o evangelho a toda a criatura, porém isso não impede os cristãos de se envolverem sabiamente em assuntos civis, políticos e etc., para o bem-estar da sociedade.
Temos exemplo de cristãos dedicados que fizeram um grande serviço na política. Um deles é o grande William Wilberforce, que se envolveu na política tornando-se um grande proponente para o fim da escravatura na Inglaterra. Ele foi o líder do movimento abolicionista do tráfico negreiro. E o que dizer do pastor Martin Luther King? Pastor que se tornou um dos mais importantes líderes do movimento dos direitos civis dos negros nos Estados Unidos, e no mundo.
Sabemos que o Senhor Jesus e Seus apóstolos exemplificaram e ensinaram que Deus não está apenas preocupado com o bem-estar espiritual das pessoas, mas também com o bem-estar físico, social e governamental. Nosso Senhor curou as pessoas de enfermidades físicas, ensinou que deveríamos dar a César o que é de César. Seus apóstolos orientaram os cristãos a viverem de forma sensata, justa e piedosamente neste mundo (Tt 2.12).
Paulo conclamou os cristãos a orar “pelos reis e por todos os que exercem autoridade, para que tenhamos uma vida tranquila e serena, em toda piedade e honestidade” (1Tm 2.2). Oração e ação, essa é a tônica do Cristianismo bíblico! Os cristãos têm uma responsabilidade para com os governos!

5. A igreja deve se dedicar à política, e não ao evangelismo.
É claro que uma visão que diz que a igreja deve apenas tentar mudar as leis e a cultura e não evangelizar é totalmente anti-bíblica e espúria.
Essa foi uma ênfase do Evangelho Social no final do século XIX e início do século XX, com suas campanhas para fazer a igreja trabalhar agressivamente para superar a pobreza, as favelas, o crime, a discriminação racial e outros males sociais. É claro que estas são boas causas, mas o movimento dava pouca ênfase à necessidade de os indivíduos colocarem a confiança pessoal em Cristo como Salvador ou a necessidade de proclamar a Bíblia inteira como a Palavra de Deus e digna de nossa crença.
Muitos bons cristãos podem inconsciente e erroneamente defender essa ideia quando pensam que apenas as boas leis irão resolver os problemas de uma nação ou trazer uma sociedade justa e sensata.
A menos que haja simultaneamente uma mudança interior nos corações e mentes das pessoas, as boas leis por si só trarão má vontade, o cumprimento externo do nível mínimo de obediência necessário para evitar a punição. O bom governo e as boas leis podem impedir muito o mau comportamento, e podem ensinar às pessoas o que a sociedade aprova, mas elas não podem por si mesmas produzir boas pessoas. Cal Thomas e Ed Dobson corretamente advertem: “Mas nós, que somos cristãos, estamos iludidos se achamos que mudaremos nossa cultura apenas por meio do poder político”[5].

PERSPECTIVA EQUILIBRADA!
Essas são perspectivas desequilibradas e até extremas sobre a temática “igreja e política”. A meu ver, precisamos buscar uma tonalidade bíblica que direcione nossa posição sobre o referido tema. Não devemos nos deixar levar pelos extremos, mas procurar equilíbrio desde que seja bíblico.
Entendo que há uma sexta perspectiva que seja equilibra e bíblica: 6. Deve haver uma influência [não imposição] cristã expressiva sobre o governo.
É interessante ter o cuidado para evitar o erro comum de usar versículos bíblicos fora de contexto para corroborar praticamente qualquer posicionamento a respeito de controvérsias políticas atuais. Nós devemos entender os textos em seus contextos e extrair os claros princípios para nossa temática.
Com relação a princípios extraídos dos textos bíblicos, nós devemos entender duas coisas: (1) aqueles princípios bíblicos que são claro, direto e categórico. Por exemplo, a Bíblia ensina claramente que os governos civis foram instituídos por Deus para punir o mal e recompensar o bem; a ideia de que as leis de uma nação devem proteger a vida das pessoas, especialmente das crianças que ainda não nasceram (por isso, sou peremptoriamente contra o aborto). (2) Há aqueles argumentos que lançam mão ou se baseiam em princípios mais amplos. Um exemplo é que a forma preferível de governo é algum tipo de democracia. Nesse caso, o argumento de um governo democrático, não se baseia em princípios bíblicos diretos e específicos, mas em princípios mais amplos (como a igualdade de todas as pessoas, uma vez que foram criadas à imagem de Deus, e a importância de estabelecer limites para o poder do governo humano).
Ainda pode-se argumentar que existem aqueles argumentos baseados numa avaliação dos fatos relevantes no mundo de hoje ou resultados atuais de certas políticas adotadas. Exemplo disso é entender se certas políticas de menos ou mais impostos contribuem para um crescimento ou não da economia de determinado país. Pode-se adquirir em certas políticas de aumento de impostos um crescimento econômico e um grande benefício para os cidadãos. Noutro espectro pode-se obter resultados negativos. Então, devem-se avaliar os resultados atuais de certas políticas adotadas.

SEJA UM INTRUMENTO DE BÊNÇÃO PARA TEU PAÍS, NÃO UM MURMURADOR QUE AMALDIÇOA!
É triste constatar que muitos crentes amaldiçoam o país onde residem. Isso não é sábio e muito menos bíblico. Como cristãos conscienciosos nós devemos seguir os ensinos bíblicos sobre a postura correta para viver num determinado país.
Nós devemos ser luz de bênção, instrução, exemplo, trabalho e testemunho para a sociedade onde vivemos e não trevas que só sabe amaldiçoar e nada faz para mudar, influenciar e redirecionar as pessoas e a nação.
Nós devemos ser sal moderado para preservar o bem-estar e a saúde moral da sociedade onde vivemos e não pessoas insalubres que só sabem reclamar e amaldiçoar as pessoas.

Cada cristão deve buscar o bem-estar da cidade, estado e país onde vive!
O conselho que Jeremias proclamou aos exilados judeus na Babilônia também apoia a ideia de que os crentes podem influenciar leis, culturas e os governos. Jeremias disse a esses exilados: “Procurai a paz da cidade para onde vos desterrei e orai por ela ao SENHOR; porque na sua paz vós tereis paz” (Jr 29.7). Os crentes fiéis a Deus entendem a responsabilidade de se empenharem na promoção do bem-estar social, cultural e político de determinada cidade, Estado ou país. O verdadeiro “bem-estar” de tal cidade será promovido através de leis e políticas governamentais que sejam consistentes com o ensino de Deus na Bíblia, não por aqueles que são contrários aos ensinamentos da Bíblia.
Cada cristão deve oportunamente procurar influenciar a cultura, a política e o governo de tal maneira que possam desfrutar de momentos de paz, felicidade, prosperidade e justiça.
Então, em vez de ficar resmungando, reclamando, choramingando, murmurando e amaldiçoando levante-se e se empenhe para influenciar o país pelas verdades de Deus e orar para que Deus tenha misericórdia e nos dê um governo mais justo! Como Deus disse por intermédio de Jeremias: “na sua paz vós tereis paz”.

Ivan Teixeira


[1] GRUDEM, W. Política Segundo a Bíblia: Princípios que todo cristão deve conhecer, p.19. São Paulo, SP, Brasil: Vida Nova, 2014.
[2] GRUDEM, 2014, p.44.
[3] BOYD, Greg. The Myth of a Christian Nation, p.21. Grand Rapids: Zondervan, 2005.
[4] Crossway Bibles. (2008). The ESV Study Bible (p.1828). Wheaton, IL: Crossway Bibles.
[5] THOMAS, Cal and DOBSON, Ed, Blinded By Might: Why the Religious Right Can’t Save America (Grand Rapids: Zondervan, 1999), p.51.

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