Baseando-se no discurso de Pedro em Atos 2, os estudiosos pentecostais
apelam para os textos bíblicos empregando uma tensão entre o que pode ser
rotulado como hermenêutica "isto é aquilo" e "isso não é
aquilo"[1].
O apóstolo Pedro explicou o evento do pentecostes com as seguintes palavras: “Mas
o que ocorre É O QUE foi dito por
intermédio do profeta Joel” (At 2.16). A interpretação de Pedro contrasta com a
interpretação daqueles que estavam “atônitos e perplexos” (v.12) e, zombando,
diziam que os cristãos estavam “cheios de vinho” (ou embriagados, v.13 - ARA).
Pedro argumentou que o evento do dia de
Pentecostes “não é aquilo” que eles pensavam, (“hermenêutica do vinho”), mas é “aquilo”
que Deus falou por intermédio do profeta Joel (“hermenêutica do
pentecostes/Espírito”): “E acontecerá depois que derramarei o Meu Espírito
sobre toda a carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão, vossos velhos
sonharão, e vossos jovens terão visões; até sobre os servos e sobre as servas
derramarei o Meu Espírito naqueles dias” (2.28-29).
Com essa “hermenêutica do Espírito” (“Isso
é Aquilo”) Pedro descarta e rejeita a “hermenêutica do vinho” (“isso Não é
Aquilo”) postulada pelo público zombador presente. Com isso, Pedro pontua que o
Cristo glorificado, ao receber a Promessa do Pai, derramou sobre Seus servos e
servas a dádiva do Espírito Santo objetivando capacitá-los para a obra
missionária tal como já havia falando antes de Sua ascensão. Essa hermenêutica
do Espírito é consequentemente uma hermenêutica missiológica. Guarde isso! “Uma
interpretação do Evento Pentecostes (hermenêutica do Espírito) que não nos leva
para uma compreensão da missão da igreja (hermenêutica missiológica) falha em
seu labor na compreensão do objetivo do revestimento de poder”. Claro, que esse
revestimento espalha-se para outras áreas da vida e ministério daqueles que
recebem e desfrutam do cumprimento da promessa. Porém, o aspecto missiológico é
basilar no construto hermenêutico do contexto do Evento Pentecostes.
Pedro deixa de lado a “hermenêutica intoxicada
ou embriagada” elencada pelos presentes e, altaneiramente, chama a atenção para
uma hermenêutica de transbordamento espiritual que se baseia na realidade
bíblica da promessa feita por Deus no passado por intermédio do profeta Joel, e
a identifica como constituindo o começo de uma Nova Era. A hermenêutica do
Espírito contém a Era do Espírito tal como profetizada no Antigo Testamento e
tão esperada pelos judeus e rabinos. Estes esperavam que a Era Messiânica
traria a Era do Espírito Santo. Agora, Pedro,
hermeneuticamente, diz que essa Era chegou! Jesus, o Messias, veio e vocês o
rejeitaram, diz Pedro, mas Deus o ressuscitou, do que todos nós somos
testemunhas. Exaltado, pois, à Destra de Deus, tendo recebido do Pai a promessa
do Espírito Santo, derramou ISTO que vedes e ouvis” (At 2.32-33). É como se
Pedro dissesse: “As intoxicações das especulações hermenêutica acabaram, pois o
Pentecostes chegou!”.
Essa hermenêutica do Pentecostes
preocupa-se não primariamente com formulações sistemáticas, (isso apenas
posteriormente) mas, por ser uma teologia mística, emerge, identifica, preserva
e retorna à experiência fundacional do Espirito Santo para capacitar os “chamados”
para serem testemunhas ousadas de Jesus Cristo (cf. At 1.8). Nesse sentido, a teologia pentecostal não
é estritamente dogmática; não busca a articulação da doutrina como a tarefa
principal da teologia[2].
Em vez disso, a teologia pentecostal busca uma relação entre espiritualidade e
doutrina para que a teologia viva se torne um constante e recíproco movimento
de vaivém entre crenças, afeições e ações, por um lado, e a articulação da
doutrina, por outro[3].
Pentecostes
como símbolo teológico
Da experiência do pentecostes que os
discípulos tiveram, e da interpretação de Pedro do evento como cumprimento da
Promessa do Pai entendemos que “a formulação da doutrina é sempre submetido à
experiência do Espírito Santo, ou, diferentemente, a teologia pentecostal é
sempre experiencial”[4]. A
formulação da doutrina depende da articulação dessa experiência, isto é, a
teologia pentecostal sempre conduz através da narrativa e do testemunho.
Estudiosos têm proposto que “os contornos
e o conteúdo da teologia pentecostal é o seu endividamento fundamental para o
dia de Pentecostes”, afirmando que, “o Pentecostes é o próprio prolegômenos a
teologia pentecostal, porque o pentecostalismo é uma forma de viver
fundamentalmente preocupado com a obra renovadora de Deus, que surge do
derramamento do Espírito Santo no dia de Pentecostes”. Nesse labor do construto
de uma teologia pentecostal o estudioso “leva a sério o dia de Pentecostes como
símbolo raiz do pentecostalismo”.
No construto da teologia pentecostal, o
estudioso não faz “uso” simplesmente da doutrina como um fim da teologia
dissociado da experiência original. Em outras palavras, “a teologia pentecostal
não busca a doutrina como um fim em si mesma, mas sustenta a possibilidade da
atualização contínua do encontro com Deus, que torna a articulação da
experiência como doutrina principalmente desnecessária. No meio da crise
epistêmica global desnudada pelas construções da pós-modernidade, a teologia
pentecostal não representa simplesmente outro construto epistêmico. Antes, na
raiz do Pentecostalismo está o Espírito de Pentecostes como o espírito de
liberdade ilimitada (e inesperada) de tais construtos”[5].
Os pentecostais definem a teologia não em
primeiro lugar e acima de tudo por seu resultado como produto do encontro com
Deus, mas por sua natureza como a expectativa da experiência contínua de Deus
no mundo. Essa antecipação é o instinto fundamental do Pentecostes e o
batimento cardíaco das experiências pentecostais.
O batimento cardíaco da hermenêutica
pentecostal é a experiência do Espírito Santo tornada possível pelo Evento de
Pentecostes.
Ivan Teixeira.
[1] ARRINGTON, French L., The Acts of the Apostles: Introduction, Translation, and Commentary
(Peabody, MA: Hendrickson, 1988), 25–32; STRONSTAD, Roger. The
Charismatic Theology of St. Luke (Peabody, MA: Hendrickson, 1984), 55–57;
idem, ‘The Influence of the Old
Testament on the Charismatic Theology of St. Luke’, Pneuma 2, no. 1 (1980):
32–50.
[2] VONDEY, Wolfgang. Beyond
Pentecostalism, p.98–108; idem, Pentecostalism,
p.82–84.
[3] STEPHENSON, Types
of Pentecostal Theology, p. 114–19.
[4] VONDEY, Wolfgang. Pentecostal
Theology: Living the full Gospel. – (Series: Systematic Pentecostal and
Charismatic Theology). Editors: Wolfgang
Vondey & Daniela C. Augustine.
[5] VONDEY, Wolfgang. Pentecostal
Theology: Living the full Gospel. – (Series: Systematic Pentecostal and
Charismatic Theology). Editors: Wolfgang
Vondey & Daniela C. Augustine.
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