quinta-feira, 31 de maio de 2018

O "FOGO" DO BATISMO COM O ESPÍRITO SANTO NÃO É JUÍZO, MAS PURIFICAÇÃO!



Batismo com o Espírito Santo E FOGO!

Muitos advogam que “fogo” nos textos de Mateus (3.11) e Lucas (3.16) significa juízo ou condenação. Porém, outros eruditos afirmam que significa uma obra purificadora do Espírito Santo na vida dos salvos. Então, batismo com o Espírito Santo e fogo descreve um único batismo com dois aspectos.
O aspecto da purificação (“e fogo”) do batismo com o Espírito Santo não é invenção dos intérpretes, mas uma promessa de Deus no Antigo Testamento. Particularmente, creio que os textos do Novo Testamento devam ser interpretados à luz das promessas do Antigo Testamento. E acredito que assim como podemos interpretar o “fogo” como purificação na vida dos salvos nos textos de Mateus 3.11 e Lucas 3.16, não devemos negligenciar que nos textos de Mateus 3.12 e Lucas 3.17 temos uma referência ao fogo (“inextinguível”) do julgamento.
Charles C. Ryrie comenta: “O batismo com o Espírito Santo ocorreu no dia de Pentecostes, ao passo que o batismo com fogo se refere aos juízos que acompanharão a Segunda Vinda de Cristo”[1]. Deve-se pontuar que ele escreve de uma perspectiva não pentecostal, mas dispensacionalista. Ele identifica o “batismo com o Espírito Santo” como aquele que “identifica os membros do corpo de Cristo com o próprio Cristo, a Cabeça ressurreta do Corpo (1Co 12.13)”[2]. O comentarista J. V. McGee concorda ao escrever:
João batizou com água. Jesus tem batizado com o Espírito Santo há mais de mil e novecentos anos. Ele também deve batizar com fogo em Sua Segunda Vinda. O fogo fala de julgamento. Algumas pessoas pensam que esta é uma referência ao Dia de Pentecostes quando o Espírito Santo veio, e houve a aparência de fogo nas cabeças daqueles reunidos. No entanto, é importante notar que em Atos 2.3 era “… como de fogo…” - não era fogo. A vinda do Espírito Santo não foi o cumprimento do batismo de fogo. Isso acontecerá na Segunda Vinda de nosso Senhor[3].

No entanto, o comentarista Alfred Plummer nos traz as seguintes colocações:
καὶ πυρί (kaì purí). Esta adição notável está ausente em Marcos. Várias explicações são sugeridas.
(1) Que as línguas de fogo no Pentecostes são significadas, é improvável. Há algum dos ouvintes de João Batista que receberam o Espírito no Pentecostes? [você pode dizer ou provar que eles não estivessem? Argumento do silêncio não é argumento]. Além disso, em Atos 1.5 καὶ πυρί (kaì purí) não é adicionado [acredito que não precisava, pois Teófilo e os demais ouvintes de Lucas entenderiam que Atos 1.5 transmite a mesma ideia de Lucas 3.16. Lucas não precisou repetir o que seu(s) destinatário(s) estava ciente].
(2) Que distingue dois batismos, o penitente [crente] com o Espírito, e o impenitente [descrente] com fogo penal, é muito improvável. As mesmas pessoas (ὑμᾶς = hymãs) devem ser batizadas com o Espírito e com fogo. No v.17 os bons e os maus são separados, mas não estão aqui. Esta frase não deve ser feita paralela ao que se segue, pois a pá de joeira não é batismo. [é interessante esta colocação, pois para os crentes temos a figura do “batismo” que identifica; para os descrentes a figura da “pá” que separa].
(3) Mais provavelmente o πυρί se refere ao poder iluminador, estimulador e purificador da graça dada pelo batismo do Messias (comp. Ml 3.2).
(4) Ou as provações de fogo que aguarda o discípulo que aceita o batismo de Cristo pode ser entendido: comp. Lc 12.50; Mc 10.38 e 39. A passagem é uma entre muitas, cujo significado exato deve permanecer duvidoso; mas a purificação do crente em vez da punição do incrédulo parece ser intencional[4].

Podemos colocar da seguinte maneira: Mesmo que “fogo” não esteja presente no dia de Pentecostes, coisa que acredito que esteja presente, ele não significa “julgamento”, mas está ligado ao batismo com o Espírito Santo, sendo uma obra iluminadora, purificadora e estimuladora da graça dada pelo Messias que batiza (cf. Is 4.2-6; Ml 3.2). Esse “batismo com o Espírito Santo e fogo” não se refere a dois batismos, mas a um único batismo com dois aspectos. Tendo em vista o (ὑμᾶς = hymãs = “vos”), o batismo com o Espírito Santo E fogo é para o mesmo grupo, que acreditamos seja os salvos.
Se os tradicionais acreditam que o “batismo com o Espírito Santo E fogo” é uma referência ao “batismo num só corpo” (descrito por Paulo em 1ª Coríntios 12.13), então é incoerente a afirmação de muitos deles que no texto de Mateus e Lucas temos dois batismos: um para os crentes e o outro para os descrentes! Visto que (ὑμᾶς = hymãs = “vos”), claramente, descreve que o “batismo com o Espirito Santo E fogo” é uma promessa para as mesmas pessoas. A simple gramática coloca por terra o argumento de dois batismos nos textos de Mateus 3.11 e Lucas 3.16.
Acrescento ainda as observações gramaticais do estudioso respeitado do Novo Testamento, D. A. Carson, cuja erudição é inquestionável no meio reformado/tradicional e que é considerado uma das maiores autoridades em manuscritos do Novo Testamento Grego, ao comentar essa passagem de Mateus 3.11. O Dr. Carson claramente demonstra que o batismo em Mateus 3.11 (e Lc 3.16) não se refere a dois batismos, um “no Espírito Santo para os justos e outro no fogo para os injustos”. Ele escreve:
Muitos veem isso como um duplo batismo, um no Espírito Santo para o justo e outro no fogo para o impenitente (cf. o trigo e a palha no v.12). O fogo (Ml 4.1) destrói e consome. Há bons motivos, contudo, para falar de “fogo”, junto com o Espírito Santo, como agente purificador. As pessoas a quem João se dirige estão sendo batizadas por ele; elas, provavelmente, arrependeram-se. Mais importante, a preposição en (“com”) não é repetida antes de fogo: uma preposição governa o “Espírito Santo” e o “fogo”, e isso normalmente sugere um conceito unificado, Espírito-fogo, ou algo semelhante (cf. M.J. Harris, DNTT, 3.1178; Dunn Baptism [Batismo], p. 10-13). No Antigo Testamento, fogo, com frequência, tem uma conotação purificadora, não destrutiva (e.g., Is 1.25; Zc 13.9; Ml 3.2,3). O batismo de água de João relaciona-se com arrependimento; mas aquele de quem ele prepara o caminho administrará o batismo de Espírito-fogo que purifica e refina a pessoa. Em uma época na qual muitos judeus sentiam que o Espírito Santo fora removido até a era messiânica, esse anúncio só podia ser saudado com animada antecipação[5].

Minha conclusão é: Baseado simplesmente na gramática grega o argumento de dois batismos, um com o Espírito e outro com fogo, cai por terra! ὑμᾶς = hymãs = “vos” se refere às pessoas que estão sendo batizadas por João e que recebem a promessa do batismo, por isso elas não podem ser ao mesmo tempo batizadas com o Espírito para salvação (visão tradicional) ou para revestimento (visão pentecostal) e ao mesmo tempo batizadas com fogo para condenação/julgamento ou juízo. A promessa do “batismo com o Espírito Santo e fogo” é para aqueles que são “batizados com água, para arrependimento”. Também devemos salientar que muitos esquecem que ‘fogo’ no Antigo Testamento não está relacionado exclusivamente ao julgamento, mas, principalmente relacionada a promessa do derramamento do Espírito Santo, com purificação (cf. Is 1.25; 6.6-7; 4.4; Ml 3.2-3). A conclusão sábia e clara no texto é que o batismo com Espírito Santo E fogo, regida por UMA ÚNICA preposição grega (en = em/com), e tendo em mente o pronome pessoal[6] (hymãs = vos), normalmente sugere um conceito unificado, “Espírito-fogo”, que, concordando com João Calvino[7], se cumpriu no Dia de Pentecostes, pois “apareceram, distribuídas entre eles, línguas como de fogo, e pousou uma sobre cada um deles” (At 2.3).
Leon Morris, respeitadíssimo erudito do Novo Testamento, depois de analisar outras interpretações, conclui: “são as mesmas pessoas [hymas = “vos”] que são batizadas com o Espírito Santo e com fogo (e os dois são governados por um en no grego). Parece melhor ver João pensando em aspectos positivos e negativos da mensagem do Messias. Aqueles que o aceitam serão purificados como por fogo (cf. Mal. 3.1 e segs.) e fortalecidos pelo Espírito Santo”[8].
Mesmo sabendo que outros eruditos, como Robert Stein[9], advogam que “fogo” se refere ao julgamento ou juízo, entendo que não seja errado ou um malabarismo hermenêutico do pentecostalismo afirmar que se refere a um único batismo, “Espírito-fogo”, cumprindo-se no Dia de Pentecostes. Acrescento como pentecostal que tal batismo é para todos os salvos como uma obra subsequente da salvação como Pedro esclareceu em Atos 2.39: “[...] para vós outros é a promessa [At 1.4-5], para vossos filhos, e para todos os que ainda estão longe, isto é, para quantos o Senhor nosso Deus chamar”. Mesmo sabendo que o pastor Marcos Granconato fez gracejos em um de seus vídeos quando um pentecostal afirmou que foi batizado (ou que crê) com Espírito Santo E FOGO! Granconato não fez exegese, apenas gracejo! Baseou-se em sua crítica em caricaturas, não em argumentos da teologia pentecostal. Por isso, sua explicação por si só cai por terra! A promessa do batismo com o Espírito Santo E FOGO é para todos os que creem!
Também esclareço que as referências de Mateus 3.12 e Lucas 3.17 fazem menção ao “fogo de julgamento”. Para aqueles que aceitam o Messias, Jesus Cristo, e são batizados em água por causa do arrependimento, recebem a promessa de serem batizados com o Espírito Santo e fogo para capacitação e purificação. Porém, aqueles que rejeitam o Messias serão queimados como “a palha em fogo inextinguível” (Lc 3.17). Veja que a palavra “fogo” é tomada em cada frase (de Lc 3 v.16 e do v.17) com sentidos que a frase-contextual lhes dá. No v.16 refere-se a um fogo purificador; no v.17 refere-se a um fogo de julgamento. Se o sentido de “fogo” no versículo 16 estivesse “obscuro”, então como bons intérpretes nós procuraríamos entender pelo contexto pré-imediato ou pós-imediato, no entanto no contexto da própria frase encontramos o significado.
Sei que cada estudioso advoga estar sendo fiel ao contexto (da frase, pré-imediato, pós-imediato, geral – como Lucas usa a expressão “fogo” e etc.,), porém devemos observar que na prática ou no dia a dia podemos usar uma palavra em duas sentenças sucessivas com significados diferentes, que é o que Lucas e Mateus o fazem, assim creio. Por exmplo, posso usar a expressão “morrendo” com significados diferentes em duas sentenças na mesma fala: “É meu amigo a nossa reunião está se estendendo e estou morrendo de fome! Mas é triste sabermos que muitas pessoas na África estão morrendo de fome de verdade!”. Na primeira sentença “morrendo” está no sentido figurado (eufemismo) para demonstrar que estou com bastante fome e não literalmente morrendo de fome. Já na segunda sentença, a referência é literal, pois pessoas realmente estão morrendo de fome. Veja, que num mesmo fôlego usei a expressão “morrendo” com significados diferentes. Então, afirmou que mesmo usando a expressão “fogo” Mateus e Lucas entendem dois significados: purificação (Mt 3.11; Lc 3.16) e julgamento (Mt 3.12; Lc 3.17).

Na visão pentecostal, nós fazemos a distinção do “batismo com o Espírito Santo” como uma obra subsequente à conversão, do “batismo num só corpo” que se refere à conversão. No primeiro caso, entendemos que o Senhor Jesus batiza o crente no Espírito Santo e fogo para capacitá-lo para a obra do ministério. No segundo caso, compreendemos que o Espírito Santo introduz (batiza, mergulha) o que crê em Jesus como Salvador e Senhor no Corpo dos eleitos – a igreja!
Igualmente, entendemos a distinção das terminologias usadas por Lucas (e Mateus) e Paulo.


[1] RYRIE, Charles C. Bíblia Anotada, p.1274 (nota de rodapé, Lc 3.16). São Paulo, SP, Brasil: Mundo Cristão, 1994.
[2] RYRIE, 1994, p.1186 (nota de rodapé, Mt 3.11).
[3] MCGEE, J. V. (1997). Thru the Bible commentary (electronic ed., Vol. 4, p. 259). Nashville: Thomas Nelson.
[4] PLUMMER, A. (1896). A critical and exegetical commentary on the Gospel according to S. Luke (p.94–95). London: T&T Clark International.
[5] CARSON, D. A. O Comentário de Mateus, pp.135, São Paulo, SP, Brasil: Editora SHEDD, 2010.
[6] Designa as pessoas a quem se dirige.
[7] CALVINO, João. As Institutas da Religião Cristã, vol.3, pp.164. Editora Cultura Cristã.
[8] MORRIS, L. (1988). Luke: an introduction and commentary (Vol.3, p.114–115). Downers Grove, IL: InterVarsity Press.
[9] Cf. STEIN, R. H. (1992). Luke (Vol.24, p.134–135). Nashville: Broadman & Holman Publishers.

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