Batismo com
o Espírito Santo E FOGO!
Muitos advogam que “fogo” nos textos de
Mateus (3.11) e Lucas (3.16) significa juízo ou condenação. Porém, outros
eruditos afirmam que significa uma obra purificadora do Espírito Santo na vida
dos salvos. Então, batismo com o Espírito Santo e fogo descreve um único
batismo com dois aspectos.
O aspecto da purificação (“e fogo”) do
batismo com o Espírito Santo não é invenção dos intérpretes, mas uma promessa
de Deus no Antigo Testamento. Particularmente, creio que os textos do Novo
Testamento devam ser interpretados à luz das promessas do Antigo Testamento. E
acredito que assim como podemos interpretar o “fogo” como purificação na vida
dos salvos nos textos de Mateus 3.11 e Lucas 3.16, não devemos negligenciar que
nos textos de Mateus 3.12 e Lucas 3.17 temos uma referência ao fogo
(“inextinguível”) do julgamento.
Charles C.
Ryrie comenta: “O batismo com o
Espírito Santo ocorreu no dia de Pentecostes, ao passo que o batismo com fogo
se refere aos juízos que acompanharão a Segunda Vinda de Cristo”[1].
Deve-se pontuar que ele escreve de uma perspectiva não pentecostal, mas
dispensacionalista. Ele identifica o “batismo com o Espírito Santo” como aquele
que “identifica os membros do corpo de Cristo com o próprio Cristo, a Cabeça
ressurreta do Corpo (1Co 12.13)”[2].
O comentarista J. V. McGee concorda
ao escrever:
João batizou
com água. Jesus tem batizado com o Espírito Santo há mais de mil e novecentos
anos. Ele também deve batizar com fogo em Sua Segunda Vinda. O fogo fala de
julgamento. Algumas pessoas pensam que esta é uma referência ao Dia de
Pentecostes quando o Espírito Santo veio, e houve a aparência de fogo nas
cabeças daqueles reunidos. No entanto, é importante notar que em Atos 2.3 era
“… como de fogo…” - não era fogo. A vinda do Espírito Santo não foi o
cumprimento do batismo de fogo. Isso acontecerá na Segunda Vinda de nosso
Senhor[3].
No entanto, o comentarista Alfred Plummer nos traz as seguintes
colocações:
καὶ πυρί (kaì purí). Esta adição notável está ausente em Marcos. Várias
explicações são sugeridas.
(1) Que
as línguas de fogo no Pentecostes são significadas, é improvável. Há algum
dos ouvintes de João Batista que receberam o Espírito no Pentecostes? [você
pode dizer ou provar que eles não estivessem? Argumento do silêncio não é
argumento]. Além disso, em Atos 1.5
καὶ πυρί (kaì purí) não é adicionado
[acredito que não precisava, pois Teófilo e os demais ouvintes de Lucas
entenderiam que Atos 1.5 transmite a
mesma ideia de Lucas 3.16. Lucas não
precisou repetir o que seu(s) destinatário(s) estava ciente].
(2) Que distingue dois batismos, o
penitente [crente] com o Espírito, e o impenitente [descrente] com fogo penal,
é muito improvável. As mesmas pessoas (ὑμᾶς = hymãs) devem ser batizadas com o Espírito e com fogo. No v.17 os bons e os maus são separados,
mas não estão aqui. Esta frase não deve ser feita paralela ao que se segue, pois
a pá de joeira não é batismo. [é interessante esta colocação, pois para os
crentes temos a figura do “batismo” que identifica;
para os descrentes a figura da “pá” que separa].
(3) Mais provavelmente o πυρί se
refere ao poder iluminador, estimulador e purificador da graça dada pelo
batismo do Messias (comp. Ml 3.2).
(4) Ou as provações de fogo que aguarda
o discípulo que aceita o batismo de Cristo pode ser entendido: comp. Lc 12.50;
Mc 10.38 e 39. A passagem é uma entre muitas, cujo significado exato deve
permanecer duvidoso; mas a purificação do crente em vez da punição do incrédulo
parece ser intencional[4].
Podemos colocar da seguinte maneira: Mesmo
que “fogo” não esteja presente no dia de Pentecostes, coisa que acredito que
esteja presente, ele não significa “julgamento”, mas está ligado ao batismo com
o Espírito Santo, sendo uma obra iluminadora, purificadora e estimuladora da
graça dada pelo Messias que batiza (cf. Is 4.2-6; Ml 3.2). Esse “batismo com o
Espírito Santo e fogo” não se refere a dois batismos, mas a um único batismo
com dois aspectos. Tendo em vista o (ὑμᾶς = hymãs
= “vos”), o batismo com o Espírito Santo E fogo é para o mesmo grupo, que
acreditamos seja os salvos.
Se os tradicionais acreditam que o “batismo
com o Espírito Santo E fogo” é uma referência ao “batismo num só corpo”
(descrito por Paulo em 1ª Coríntios 12.13), então é incoerente a afirmação de
muitos deles que no texto de Mateus e Lucas temos dois batismos: um para os crentes e o outro para os descrentes! Visto que (ὑμᾶς
= hymãs = “vos”), claramente,
descreve que o “batismo com o Espirito Santo E fogo” é uma promessa para as
mesmas pessoas. A simple gramática coloca por terra o argumento de dois
batismos nos textos de Mateus 3.11 e
Lucas 3.16.
Acrescento ainda as observações gramaticais
do estudioso respeitado do Novo Testamento, D. A. Carson, cuja erudição é inquestionável no meio
reformado/tradicional e que é considerado uma das maiores autoridades em
manuscritos do Novo Testamento Grego, ao comentar essa passagem de Mateus 3.11. O Dr. Carson claramente demonstra que o batismo em Mateus 3.11 (e Lc 3.16) não se refere a dois batismos, um “no
Espírito Santo para os justos e outro no fogo para os injustos”. Ele escreve:
Muitos veem
isso como um duplo batismo, um no Espírito Santo para o justo e outro no fogo
para o impenitente (cf. o trigo e a palha no v.12). O fogo (Ml 4.1) destrói e
consome. Há bons motivos, contudo, para falar de “fogo”, junto com o Espírito
Santo, como agente purificador. As pessoas a quem João se dirige estão sendo
batizadas por ele; elas, provavelmente, arrependeram-se. Mais importante, a
preposição en (“com”) não é repetida
antes de fogo: uma preposição governa o “Espírito Santo” e o “fogo”, e isso
normalmente sugere um conceito unificado, Espírito-fogo, ou algo semelhante
(cf. M.J. Harris, DNTT, 3.1178; Dunn
Baptism [Batismo], p. 10-13). No
Antigo Testamento, fogo, com frequência, tem uma conotação purificadora, não
destrutiva (e.g., Is 1.25; Zc 13.9; Ml 3.2,3). O batismo de água de João
relaciona-se com arrependimento; mas aquele de quem ele prepara o caminho
administrará o batismo de Espírito-fogo que purifica e refina a pessoa. Em uma
época na qual muitos judeus sentiam que o Espírito Santo fora removido até a
era messiânica, esse anúncio só podia ser saudado com animada antecipação[5].
Minha conclusão é: Baseado simplesmente na
gramática grega o argumento de dois batismos, um com o Espírito e outro com fogo,
cai por terra! ὑμᾶς = hymãs = “vos” se
refere às pessoas que estão sendo batizadas por João e que recebem a promessa
do batismo, por isso elas não podem ser ao mesmo tempo batizadas com o Espírito
para salvação (visão tradicional) ou para revestimento (visão pentecostal) e ao
mesmo tempo batizadas com fogo para condenação/julgamento ou juízo. A promessa
do “batismo com o Espírito Santo e fogo” é para aqueles que são “batizados com água,
para arrependimento”. Também devemos salientar que muitos esquecem que ‘fogo’
no Antigo Testamento não está relacionado exclusivamente ao julgamento, mas,
principalmente relacionada a promessa do derramamento do Espírito Santo, com
purificação (cf. Is 1.25; 6.6-7; 4.4; Ml 3.2-3). A conclusão sábia e clara no
texto é que o batismo com Espírito Santo E fogo, regida por UMA ÚNICA preposição
grega (en = em/com), e tendo em mente
o pronome pessoal[6] (hymãs = vos), normalmente sugere um
conceito unificado, “Espírito-fogo”, que, concordando com João Calvino[7],
se cumpriu no Dia de Pentecostes, pois “apareceram, distribuídas entre eles, línguas
como de fogo, e pousou uma sobre cada um deles” (At 2.3).
Leon Morris, respeitadíssimo erudito do Novo Testamento,
depois de analisar outras interpretações, conclui: “são as mesmas pessoas [hymas = “vos”] que são batizadas com o
Espírito Santo e com fogo (e os dois são governados por um en no grego). Parece melhor ver João pensando em aspectos positivos
e negativos da mensagem do Messias. Aqueles que o aceitam serão purificados como
por fogo (cf. Mal. 3.1 e segs.) e fortalecidos pelo Espírito Santo”[8].
Mesmo sabendo que outros eruditos, como Robert Stein[9],
advogam que “fogo” se refere ao julgamento ou juízo, entendo que não seja
errado ou um malabarismo hermenêutico do pentecostalismo afirmar que se refere
a um único batismo, “Espírito-fogo”, cumprindo-se no Dia de Pentecostes. Acrescento
como pentecostal que tal batismo é para todos os salvos como uma obra
subsequente da salvação como Pedro
esclareceu em Atos 2.39: “[...] para
vós outros é a promessa [At 1.4-5], para vossos filhos, e para todos os que
ainda estão longe, isto é, para quantos o Senhor nosso Deus chamar”. Mesmo
sabendo que o pastor Marcos Granconato
fez gracejos em um de seus vídeos quando um pentecostal afirmou que foi
batizado (ou que crê) com Espírito Santo E FOGO! Granconato não fez exegese, apenas gracejo! Baseou-se em sua crítica
em caricaturas, não em argumentos da teologia pentecostal. Por isso, sua
explicação por si só cai por terra! A promessa do batismo com o Espírito Santo
E FOGO é para todos os que creem!
Também esclareço que as referências de Mateus 3.12 e Lucas 3.17 fazem menção ao “fogo de julgamento”. Para aqueles que
aceitam o Messias, Jesus Cristo, e são batizados em água por causa do
arrependimento, recebem a promessa de serem batizados com o Espírito Santo e
fogo para capacitação e purificação. Porém, aqueles que rejeitam o Messias serão
queimados como “a palha em fogo inextinguível” (Lc 3.17). Veja que a palavra “fogo”
é tomada em cada frase (de Lc 3 v.16 e do v.17) com sentidos que a frase-contextual
lhes dá. No v.16 refere-se a um fogo
purificador; no v.17 refere-se a um
fogo de julgamento. Se o sentido de “fogo” no versículo 16 estivesse “obscuro”, então como bons intérpretes nós procuraríamos
entender pelo contexto pré-imediato ou pós-imediato, no entanto no contexto da
própria frase encontramos o significado.
Sei que cada estudioso advoga estar sendo
fiel ao contexto (da frase, pré-imediato, pós-imediato, geral – como Lucas usa
a expressão “fogo” e etc.,), porém devemos observar que na prática ou no dia a
dia podemos usar uma palavra em duas sentenças sucessivas com significados diferentes,
que é o que Lucas e Mateus o fazem, assim creio. Por exmplo, posso usar a
expressão “morrendo” com significados diferentes em duas sentenças na mesma
fala: “É meu amigo a nossa reunião está se estendendo e estou morrendo de fome!
Mas é triste sabermos que muitas pessoas na África estão morrendo de fome de
verdade!”. Na primeira sentença “morrendo” está no sentido figurado (eufemismo)
para demonstrar que estou com bastante fome e não literalmente morrendo de
fome. Já na segunda sentença, a referência é literal, pois pessoas realmente
estão morrendo de fome. Veja, que num mesmo fôlego usei a expressão “morrendo”
com significados diferentes. Então, afirmou que mesmo usando a expressão “fogo”
Mateus e Lucas entendem dois significados: purificação (Mt 3.11; Lc 3.16) e
julgamento (Mt 3.12; Lc 3.17).
Na visão pentecostal, nós fazemos a distinção
do “batismo com o Espírito Santo” como uma obra subsequente à conversão, do
“batismo num só corpo” que se refere à conversão. No primeiro caso, entendemos
que o Senhor Jesus batiza o crente no Espírito Santo e fogo para capacitá-lo
para a obra do ministério. No segundo caso, compreendemos que o Espírito Santo
introduz (batiza, mergulha) o que crê em Jesus como Salvador e Senhor no Corpo
dos eleitos – a igreja!
Igualmente, entendemos a distinção das
terminologias usadas por Lucas (e Mateus) e Paulo.
[1] RYRIE, Charles C. Bíblia Anotada, p.1274 (nota de rodapé,
Lc 3.16). São Paulo, SP, Brasil: Mundo Cristão, 1994.
[2] RYRIE, 1994, p.1186 (nota de rodapé, Mt 3.11).
[3] MCGEE, J. V.
(1997). Thru the Bible commentary
(electronic ed., Vol. 4, p. 259). Nashville: Thomas Nelson.
[4] PLUMMER, A. (1896).
A critical and exegetical commentary on
the Gospel according to S. Luke (p.94–95). London: T&T Clark
International.
[5] CARSON, D. A. O
Comentário de Mateus, pp.135, São Paulo, SP, Brasil: Editora SHEDD, 2010.
[6] Designa as pessoas a quem se dirige.
[7] CALVINO, João. As
Institutas da Religião Cristã, vol.3, pp.164. Editora Cultura Cristã.
[8] MORRIS, L. (1988). Luke:
an introduction and commentary (Vol.3, p.114–115). Downers Grove, IL:
InterVarsity Press.
[9] Cf. STEIN, R.
H. (1992). Luke (Vol.24, p.134–135).
Nashville: Broadman & Holman Publishers.